SEM-ABRIGO: 90% são casos psiquiátricos
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SEM-ABRIGO: 90% são casos psiquiátricos

Começo por sugerir a todos os leitores o visionamento do filme “Pára-me de repente o pensamento” do cineasta Jorge Pelicano que retrata bem a vida, as rotinas, de um hospital psiquiátrico onde “a lucidez e a loucura vivem juntas.”
Estive a rever este trabalho a propósito dos sem-abrigo. De acordo com os especialistas a maioria destes homens e mulheres, mais homens do que mulheres, tem problemas de saúde mental, acompanhados ou não por consumos de droga e álcool.

António Bento, diretor do Serviço de Psiquiatria Geral do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa, em declarações ao Expresso, diz-nos que “há muita ideologia em torno deste fenómeno, mas ninguém os conhece verdadeiramente. Diz-se que são casos de pobreza, mas nunca se diz que são doentes. A verdade é que 90% são casos psiquiátricos.” Com toda a experiência de um especialista que acompanha, neste momento, cerca de 300 doentes psiquiátricos em situação de sem-abrigo, afirmou também não compreender que se tenha elaborado (finalmente) uma estratégia nacional para a integração de sem-abrigo (2017-2030) sem ouvir especialistas em saúde mental.

Igualmente difícil de compreender é a grande diferença existente entre os números indicados pelo Presidente da República, cerca de 8000, e os registados pela Segurança Social, cerca de 4000…
Com a vaga de frio que se registou no nosso país, alguns municípios ativaram planos de emergência para garantir aos sem-abrigo comida, um duche quente, agasalhos e dormida em locais que proporcionem abrigo e conforto.

Ao ver nos telejornais as reportagens, lembrei-me do que nos disse, em Viseu, e escreveu no seu livro “E se eu fosse Deus?” o meu amigo Fernando Correia… Recordemos, o Fernando escreveu que ano após ano, os sem-abrigo são “escondidos” dos olhares dos turistas que se inebriam com a magnífica luz de Lisboa e apenas são alvo da atenção mediática no Natal e quando as noites geladas podem precipitar a morte de alguns…

No Natal de 2017 e no início de 2018, o Fernando volta, lamentavelmente, a ter razão! Após muitas investidas, acompanhado pelo Henrique, ao submundo da capital, o Fernando apela a que o poder político olhe para estas pessoas e as ajude, de facto, a reencontrarem-se com a vida.

Em boa hora o Presidente da República elegeu o fim dos sem-abrigo como um dos principais desígnios do país e estabeleceu 2023 como meta para garantir um teto a quem não o tem. Este objetivo ambicioso talvez seja alcançável com a implementação da nova estratégia em Lisboa que passa pela atribuição de casas, como primeiro passo, e, posteriormente, garantir um acompanhamento individualizado, trabalhando a inclusão, a partir de um diagnóstico da situação e atribuição de um gestor de caso.

A mudança de paradigma de intervenção e a determinação do Presidente poderão ser fulcrais para garantir um teto e um novo projeto de vida aos homens e mulheres que, num determinado momento, perderam a esperança, mas não o seu direito à vida e à dignidade.

 

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