Ser Mãe - Rosa Almeida
Entrevistas

Ser Mãe – Rosa Almeida

… se Deus me deu as minhas meninas assim, é porque sabe que saberei lidar com esta doença Rosa Almeida

Rosa Almeida nasceu em 1962 em Castelo de Neiva, distrito de Viana do Castelo. Casou aos 19 anos com Domingos Almeida e conheceu cedo a vida de emigrante, tendo vivido 6 anos na Argentina, antes de vir para o Canadá. Foi mãe de Manuel em Portugal, mas a Sandra e a Paula, gémeas idênticas nasceram no Canadá.

Os desafios de uma mãe são, por norma, muito semelhantes… mas não para Rosa. É comum que o tempo de gestação de gémeas seja mais curto por diversas razões, e no caso da Rosa não fugiu à regra. Quando chega a casa depois de passar por um parto díficil, Rosa tenta adaptar-se à vida nova, agora com duas filhas lindas de olho azul. Em 1975 ainda não havia ecografias que pudessem sustentar o sexto sentido apurado desta mãe.

Um dia, quando tudo parecia bem, Rosa nota algo de diferente nas gémeas com 3 meses de vida. As meninas não tínham aquela firmeza no pescoço, como é habitual em bebés daquela idade e simultaneamente a vista tremia a ambas. Como qualquer mãe, corre para o médico e de lá foi conduzida para o hospital das crianças… e tudo mudou. Os exames nunca mais pararam, ao ponto de ficarem traumatizadas. O diagnóstico… o pior que uma mãe pode ouvir – Sandra e a Paula têm a mesma anomalia genética provocando distrofia muscular progressiva. Devota e crente em Deus, Rosa agarra-se à fé para recuperar a “genica” e força que a caracterizam.

Chorou muito e depois enxugou as lágrimas e dedicou-se de corpo e alma às filhas. Ensinou-as a dar os primeiros passos, falar, dançar e a andar de triciclo. Aos 7 anos de idade os primeiros sinais da doença surgem, progredindo rápidamente. Primeiro vem o andarilho, e em menos de 1 ano, a cadeira de rodas manual e logo a seguir a elétrica. Os músculos perdiam a força, mas Rosa não! Nunca desitiu, contradiando os relatórios médicos. O seu amor, carinho e dedicação foram o melhor tratamento que Sandra e Paula poderiam receber.

Apesar de todas as adversidades, esta mãe nunca confinou as filhas às quatro paredes. Antes pelo contrário, sempre quis vê-las felizes e a conviver. Andaram sempre na escola, passeiam e fazem, inclusivé, férias em Portugal. Rosa faz-se acompanhar pelas filhas, sempre que possível. Hoje, Sandra e Paula frequentam a Luso Canadian Charitable Society, no polo de Toronto, onde convivem durante algumas horas por dia, de segunda a sexta-feira, horas preciosas para que Rosa se possa dedicar aos seus afazeres, pois, não tem folgas.

Rosa é mãe como todas as mães, porém, a vida desta mãe é especial, com tudo o que a vida lhe trouxe, há 43 anos. Rosa é o verdadeiro exemplo de força, garra, determinação e persistência. Por estas e muitas mais razões, Rosa foi a mãe escolhida para ser homenageada, por outra mãe, que também teve e tem desafios, contudo incomparáveis.

Em maio estivemos à conversa com Rosa Almeida e aprendemos o que significa, realmente, “Ser Mãe”!

Revista Amar: Fale-nos um pouco de si.
Rosa Almeida: O meu nome é Rosa Almeida, sou de Castelo de Neiva, Viana do Castelo e tenho 75 anos. Sou mãe de três filhos lindos, o Manuel o meu mais velho e da Sandra e Paula, que são gémeas idênticas. Casei ainda não tinha 20 anos e o meu marido emigrou para a Argentina e eu fiquei grávida em Portugal e só 3 anos depois é que fomos ter com o meu marido.

Revista Amar: Quanto tempo estiveram imigrados na Argentina?
Rosa Almeida: O meu marido esteve lá 10 anos e eu estive 6 anos.

Revista Amar: E depois regressaram a Portugal?
Rosa Almeida: Não, viemos para aqui ter com a minha irmã, em 1972.

Revista Amar: Então a Sandra e a Paula nasceram aqui?
Rosa Almeida: Sim, no dia 13 de Novembro de 1975.

Revista Amar: Qual é a diferença de idade entre os seus filhos?
Rosa Almeida: É de 12 anos.

Revista Amar: Quando as meninas nasceram, soubesse logo que elas tinham algum problema de saúde?
Rosa Almeida: Não. Apesar de terem nascido permaturas, com 8 meses, e o parto não foi fácil, estive muito tempo em trabalho de parto sem ninguém me ajudar, inclusive pedi ajuda porque a Sandra já estava cá fora e fui ignorada… mas mesmo apesar disto tudo elas não apresesentavam qualquer sinal de que teriam algum problema, como é costume dizer – elas nasceram perfeitas.

Revista Amar: Então quando levou as meninas para casa não sabia nada?
Rosa Almeida: Não, os médicos não me disseram nada.

Revista Amar: Quando deu conta que alguma coisa não estava bem com elas?
Rosa Almeida: Quando elas tinham 3 meses.

Revista Amar: Qual ou quais foram os primeiros sinais?
Rosa Almeida: Os olhinhos delas começaram a tremer e não tinham força para segurar a cabecinha.

Revista Amar: Os olhinhos das 2 meninas, ao mesmo tempo?
Rosa Almeida: Sim, elas são geneticamente idênticas e logo têm a mesma doença genética.

Revista Amar: O médico partilhou logo das suas preocupações?
Rosa Almeida: Sim e mandou-me para o hospital das crianças para fazer exames, e foram muitos exames ao ponto das meninas ficarem traumatizadas e terem medo até quando pessoas nos visitavam em casa.

Revista Amar: Como lidou com a notícia que elas sofriam desta doença genética?
Rosa Almeida: Pensei “se Deus me deu as minhas meninas assim, é porque sabe que saberei lidar com esta doença”… claro que chorei muito e tudo… não tenho mais lágrimas. Depois aceitei e só pedia a Deus para que me desse força para encarar a vida, hoje para mim tomar conta delas é como outra mãe a tomar conta dos seus filhos.

Revista Amar: Mas as meninas chegaram andar, certo?
Rosa Almeida: Sim, elas tiveram um crescimento e desenvolvimento normal até ao 7 anos. Falavam, caminhavam, brincavam, corriam, nadavam, faziam tudo, eram independentes como é suposto serem crianças de 7 anos… e elas ainda se lembram desses tempos.

Revista Amar: O que aconteceu aos 7 anos?
Rosa Almeida: Os pézinhos começaram a virar para dentro e logo a seguir precisaram do andarilho para se apoiarem.

Revista Amar: A doença desenvolveu-se gradualmente ou foi tudo muito rápido?
Rosa Almeida: Para mim foi tudo muito rápido e os médicos avisaram-me que dia após dia os músculos iriam enfraquecendo… começou pelos pés e depois os músculos começaram a enfraquecer o que as levou primeiramente a usar o andarilho e a seguir a cadeira de rodas manual que, enquanto tiveram força nos braços, elas próprias puxavam as rodas. Não muito tempo depois os braço deixaram de ter força também e tivemos que trocar para a cadeira elétrica.

Revista Amar: As meninas para além dos muitos exames e tratamentos, alguma vez precisaram de cirúrgia?
Rosa Almeida: Sim, aos 22 anos foram operadas à coluna e até aí ainda que com muito esforço elas conseguiam ficar de pé apoiadas em mim, claro. Depois da cirúrgia já nem isso faziam e precisei de pessoas habilitadas para me ajudarem a tomar conta delas.

Revista Amar: A Rosa fez questão de dar uma vida normal às suas filhas.
Rosa Almeida: Sempre… eu nunca as fechei em casa. Acho que eu é que morria se me obrigassem a fazer isso.

Revista Amar: Elas andaram na escola?
Rosa Almeida: Sim, sempre. Andaram na St. Peter School, depois mudei-as para Sunny View School porque tinham educadores especializados. Andaram no liceu, na Brockton High School, noutra escola na área da Lansdowne e College, e da Christie e da Bloor… mas já não me lembro do nome destas duas escolas. Dali foram para a March of Dimes. Todos os anos íam para o campo de férias, íam de manhã e voltavam à tarde. Houve uma ocasião que as deixei dormir na Luso Canadian Charitable Society aqui de Toronto, e andei na mesma durante a noite a ir às camas para ver se elas estavam cobertas ou a respirar.

Revista Amar: E agora, onde andam?
Rosa Almeida: Estão na Luso-Canadian Charitable Society e gostam muito. Vão todos os dias, do meio da manhã ao meio da tarde.

Revista Amar: Elas também têm problemas repiratórios?
Rosa Almeida: Também, foi no Sunnybrock que me disseram que elas tinham menos de 25% de função pulmonar porque o músculo está fraco.

Revista Amar: A Rosa têm muitos cuidados com elas.
Rosa Almeida: Muitos cuidados mesmo. Um dos muitos cuidados que tenho é que os lençóis estejam sempre esticados, para não provocar feridas… têm 43 anos e nunca tiveram nenhuma! Andam sempre limpinhas e ponho um lencinho à cintura de cada uma, para qualquer eventualidade.

Revista Amar: Elas têm noção de como eram antes da doença progredir?
Rosa Almeida: Sim.

Revista Amar: Elas entendem tudo, certo?
Rosa Almeida: Sim… elas sabem o que está certo e errado, sabem quem lhes faz bem, sabem o que querem e têm muito boa memória.

Revista Amar: Elas alguma vez se revoltaram ou questionaram “porquê eu mãe”?
Rosa Almeida: Não, elas aceitaram a doença.

Revista Amar: É costume vermos a Rosa com a Sandra e a Paula, leva-as sempre consigo.
Rosa Almeida: Sempre, não consigo sair e deixá-las… seja de férias ou festas.

Revista Amar: Também as levou a Portugal?
Rosa Almeida: Sim, muitas vezes enquanto a minha mãezinha foi viva.

Revista Amar Elas gostam de Portugal?
Rosa Almeida: Adoram.

Revista Amar: Fale-nos um pouco da personalidade de cada uma.
Rosa Almeida: Olhe, a Sandra é mandona, teimosa e é calada mesmo quando está com dores não se queixa, já a Paula é mais queixosa, mas mais divertida, concorda com tudo e para ela está tudo sempre bem.. a Paula sai à mãe e a Sandra sai ao pai.

Revista Amar: Elas são muito amigas uma da outra?
Rosa Almeida: Se são… desde de pequeninas. Por exemplo, sempre quiseram andar de igual e até hoje é assim.

Revista Amar: E o seu filho, Manuel, qual é a ligação com as irmãs?
Rosa Almeida: Ele adora-as! Está sempre a mimá-las quer com bonecos ou coisas que elas gostam, como por exemplo, trazer lasagna. Foi sempre muito bom filho e ajudou-me sempre.

Revista Amar: A Rosa dedicou-se a 100% às suas filhas, certo?
Rosa Almeida: Sim. Eu ainda trabalhei à noite quando a minha mãe esteve aqui de visita, mas ela foi embora e eu nunca mais trabalhei. Não tenho muito dinheiro, mas nunca faltou nada às minhas filhas, sempre dei o que elas precisavam. Do governo só comecei a ter alguma ajuda depois que elas foram operadas à coluna.

Revista Amar A Rosa pensa no futuro?
Rosa Almeida: Não penso e nem quero pensar. Está na mão de Deus.

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