Arquitetura, arte e história de mãos dadas
Arte & CulturaToronto

Arquitetura, arte e história de mãos dadas

Quando em 2015, a cidade de Toronto foi anfitriã dos XVII Jogos Pan-Americanos, uma zona pobre, na parte leste de Toronto, sofreu grandes transformações e melhoramentos. No princípio do século XIX tinha sido habitada, maioritariamente, por imigrantes irlandeses que trabalhavam em fábricas de tijolos e nas destilarias de uísque implantadas naquela área, de cariz essencialmente industrial.

Nos últimos cinco anos, dois bairros floresceram ali: um, é conhecido como “Canary”, (um restaurante muito popular “The canary” com uma imagem desse pássaro no prédio mais antigo inspirou o nome) e o outro denominado “Corktown”, nome originário dum distrito na Irlanda, local de nascimento de muitos imigrantes desse país na altura da Grande Fome da Batata.

Revista Amar - Toronto - Arquitetura, arte e história de mãos dadas
Corktown Common – Créditos © Manuela Marujo

 

Dada a localização privilegiada, muito próximo da Baixa da cidade – fica ligado ao turístico Distillery District -, os condomínios em prédios de arquitetura moderna de vanguarda têm atraído casais jovens, empresários e artistas sendo esta parte da cidade um exemplo de urbanização de bom gosto. Poucos edifícios restam do século XIX – a igreja Little Trinity Church de 1843 (no 143 da King Street East) e o prédio da escola pública mais antiga da cidade de 1849, graças ao visionário Enoch Turner, hoje transformada em museu e património histórico, sita no número 106 da Trinity Street.

Revista Amar - Toronto - Arquitetura, arte e história de mãos dadas - Little Trinity Church
Little Trinity Church – Créditos © Manuela Marujo
Revista Amar - Toronto - Arquitetura, arte e história de mãos dadas - Enoch Turner Schoolhouse
Enoch Turner Schoolhouse – Créditos © Manuela Marujo

Revista Amar - Toronto - Arquitetura, arte e história de mãos dadas 2

 

Caminhar ao longo da Front Street leva-nos à “Diamond Jubilee Promenade”, uma larga e extensa alameda, onde no verão de 2015 foram plantadas 41 árvores simbólicas, dedicadas a cada país ou território participante nos Jogos. Nesse ano, mais de 10 000 atletas, treinadores e outros técnicos ocuparam os apartamentos, e ainda 20 000 voluntários circularam na área que abraçou o maior evento desportivo internacional na história do Canadá. Hoje, restaurantes, boutiques, estúdios de artistas, spas e outros serviços dão à alameda cor e muita vivacidade.

Revista Amar - Toronto - Arquitetura, arte e história de mãos dadas - Diamond Jubilee Promenade
Diamond Jubilee Promenade – Créditos © Manuela Marujo

 

Ao caminhar naquela área, o que mais me agradou foi o destaque dado a instalações de arte, ao alcance de todos, nessa “Promenade”. Gostei em particular de duas: “The Water Guardians” e “Garden of Future Follies”. Na primeira, os artistas Jennifer Marman e David Borins criaram um arco, formado por três figuras que simbolizam a força da água, sob o qual se pode circular e que à noite surgem com olhos luminosos para nos guiar. “The Water Guardians” ajuda a valorizar e a lembrar os benefícios da proximidade das águas do rio (Don) e do lago (Ontário), ali ao lado. A segunda impressiona pela sua localização sobre o cimento da calçada e pelas inúmeras leituras que evoca. As peças escultóricas fazem lembrar outras de jardins franceses e ingleses, onde surgem pagodes, pirâmides, máscaras, figuras humanas e de seres fantasmagóricos. Criada pelos artistas Hadley e Maxwell, esta instalação presta homenagem ao passado, à história universal. Os artistas quiseram que qualquer transeunte tivesse acesso a peças que, normalmente, só se veem nos museus.

Revista Amar - Toronto - Arquitetura, arte e história de mãos dadas - The Water Guardians
The Water Guardians – Créditos © Manuela Marujo
Revista Amar - Toronto - Arquitetura, arte e história de mãos dadas - Peças uscultóricas criadas por Hadley e Maxwell (lado oposto)
Peças uscultóricas criadas por Hadley e Maxwell (lado oposto) – Créditos © Manuela Marujo
Revista Amar - Toronto - Arquitetura, arte e história de mãos dadas - Peças uscultóricas criadas por Hadley e Maxwell (um lado)
Peças uscultóricas criadas por Hadley e Maxwell (um lado) – Créditos © Manuela Marujo

Revista Amar - Toronto - Arquitetura, arte e história de mãos dadas 4

Os arquitetos responsáveis pela urbanização de “Canary” e “Corktown” não se esqueceram de os integrar na natureza. Um parque bem delineado, conhecido como “Corktown Common”, permite circular por meio de árvores, arbustos e espécies endémicas. Há pequenas lagoas com vida animal, parque infantil, complexo desportivo, mesas de piqueniques e trilhas com ligações a outras zonas pedonais junto do Rio Don e do Lago Ontário.

É neste parque que se encontra uma placa histórica que explica a origem do nome, de certo modo pejorativo, dado a Toronto: “Hogtown” (cidade dos porcos). A conhecida marca “Maple Leaf Meats” tem origem numa grande empresa de carne suína que existia naquela zona “William Davies Company” (1874-1927) e que na época era a maior produtora de carne de porco de todo o Império Britânico.

A zona leste de Toronto tem-se desenvolvido de modo muito mais lento do que a zona ocidental da cidade. As transformações, no entanto, estão à vista de todos. Para se conhecer bem a zona história, não basta entrar no St. Lawrence Market – e deliciar-se com a tradicional sandes de “pealmeal bacon” – onde o próprio William Davies começou a vender essa carne, nos primeiros anos, antes de se tornar milionário. Na mesma rua, uma caminhada de 15 minutos, surpreende pela simbiose entre história, arquitetura e arte na cidade.

Manuela Marujo

Professora Emérita da Universidade de Toronto

Redes Sociais - Comentários

Ver também
Fechar
Botão Voltar ao Topo