Camané & Mário Laginha
MúsicaEntrevistas

Camané & Mário Laginha

Camané e Mário Laginha não são um ao outro estranhos. Já com várias concerto juntos, com o bom entendimento sentido em muitas colaborações, resultou agora o projeto: CAMANÉ & MÁRIO LAGINHA – Aqui Está-se Sossegado.

Este é um projeto pensando de raiz para dar mais brilho a uma voz e um piano que se descobriram cúmplices desde a primeira vez que encheram um palco.

Revista Amar - Portugal - Camané & Mário Laginha
Fotografia © Camané/Facebook

 

Revista Amar: Um tema que é impossível escapar nestes tempos de pandemia. Muitas portas se fecharam, mas agora, aos poucos, acabamos por ver, mesmo com as regras impostas pela Direcção-Geral de Saúde, os artistas a voltarem. Como foi esse “pisar os palcos” e ouvir os aplausos do público, que é muito importante?
Camané: Sim, é muito importante e o ambiente quente é muito preciso, principalmente em espectáculos de fado em que existe muita empatia, tanto da pessoa que está a ouvir como quem está a cantar. Eu comecei logo por fazer alguns concertos a partir de maio, mas sem público, em streaming, sem aplausos. Lembro-me de fazer um concerto com a Orquestra Metropolitana de Lisboa, onde trouxe diferentes arranjos para alguns dos meus temas de maior sucesso e com novas abordagens musicais. Com 50 músicos em cima do palco e eu a cantar… a Ana Moura e o Ricardo Ribeiro também participaram, mas sem público nenhum. Foi óptimo porque os elementos da orquestra, cada vez que acabávamos de cantar um tema, batiam palmas com os instrumentos. Até ajudava um pouco o ambiente no Castelo de São Jorge. Mas aos poucos, a partir do principio do verão, comecei a fazer espectáculos com público, principalmente em salas de teatro que têm mais hipóteses de serem desinfetadas, sempre com os cuidados todos, mas com metade do público. Havia sítios que tinham as salas completamente esgotadas e tivemos que fazer dois dias. Em vez de fazer um dia de concerto, fazia dois, para que as pessoas todas pudessem assistir ao espectáculo.

RA: Um outro projeto recente é o 100Amália. Sabemos que é uma conceção artística do Camané e é uma peça de teatro musical com orquestra. O que mais nos pode dizer sobre esse trabalho?
Camané: Escreveram que era uma conceção artística minha… mas eu não fiz muita coisa. Dei a minha opinião e estive com os miúdos. Isto é um espectáculo musical de fado mas feito por crianças. Eu dei a ideia. Eu queria fazer aqueles musicais onde é uma criança a fazer de Amália. Amália, que será sempre muito difícil de retratar com toda aquela dimensão artística. A minha ideia foi eles irem para o palco, sentarem-se e começarem a falar sobre histórias. Todas as histórias que ouviram dos pais e avós sobre a Amália. Eu não queria uma criança com 14 anos vestida de Amália. Quis que falassem daquilo de uma forma simples e muito mais verdadeira.

Revista Amar - Portugal - Camané & Mário Laginha
Créditos © Camané/Facebook

 

 

RA: Os discos da Amália faziam parte da coleção dos teus pais. Este foi o teu primeiro contacto com o fado?
Camané: Foi a Amália, Carlos do Carmo, Marceneiro, Fernando Maurício, Teresa de Noronha… havia muitas pessoas nessa altura. Lembro-me de fadistas homens que eu gostava muito e que também me incentivaram imenso. Nessa altura era engraçado. Ou ouvia os discos em casa, com 7 ou 8 anos, mas também me lembro de ir aos fim de semanas com os meus pais às casas de fados. Numa delas estava a Amália. Existem fotografias minhas, tiradas nessa noite. Tinha 10 anos.

RA: Como é que a Amália iria reagir a este trabalho do Camané? O piano encaixa bem no fado? A Amália tentou colocar o piano também no fado.
Camané: Sim, a Amália fez isso. Pode-se ouvir no disco Busto na fase fantástica dela. Tocam no disco José Nunes na guitarra portuguesa, Castro Mota na viola e Alain Oulman no piano. O fado ao piano é uma ideia que tive – fazer um fado tradicional e clássico ao piano e nunca uma fusão fado-jazz. Trazer o Laginha para este disco é que foi muito interessante. Nós não temos o mesmo registo sonoro, mas o fado começou a ser criado e tocado ao piano em Palácios. Depois é que passou para guitarra portuguesa. É evidente que o fado é guitarra portuguesa. Inicialmente falei com o Laginha a convidá-lo para fazermos um concerto. Não estávamos a pensar num disco, mas percebemos que ele tinha-se aproximado do fado. Até que fomos para estúdio – já tínhamos ensaios e até já tínhamos tocado o reportório todo. Gravámos em takes e super sossegados . Aqui está-se sossegado é uma música do meu bisavô, (José Júlio Paiva), que a terá feito em 1918. O título da música original era Fado Espanhol e o poema adaptei-o de um poema de Fernando Pessoa. Nunca tinha ouvido a voz do meu bisavô, até há quatro anos, quando disse o nome dele a um colecionador que tinha o disco e que me deu para ouvir. O poema do Pessoa tem a ver com o agora, com o não ter culpa do passado ou medo do futuro. O sossego é sentirmo-nos bem com o que estamos a fazer. E este sossego também acontece porque não pensámos fazer um disco; pensámos fazer concertos. De repente, quando fomos para o disco, foi um sossego porque já tínhamos trabalhado imenso.

Paulo Perdiz

MDC Media Group

Redes Sociais - Comentários

Ver também
Fechar
Botão Voltar ao Topo