Os 40 pescadores que mais ensinam sobre a história de Lagos
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Os 40 pescadores que mais ensinam sobre a história de Lagos

A poucos metros do Mar d’Estórias, na Avenida dos Descobrimentos, a sabedoria do mar e da história da nossa cidade está patente em fontes vivas – na imensidão de vivências de 40 pescadores Lacobrigenses. Lagos, terra de descobrimentos, de homens do mar, de enseadas douradas e águas cristalinas, conta com estes pescadores para partilhar as histórias de autenticidade vividas a bordo dos seus pequenos barcos tradicionais.

Na década de 60, para complementar a vida difícil da faina, alguns destes homens do mar limpavam cuidadosamente os seus barcos de madeira e começaram a dar a conhecer a costa d’oiro de Lagos, através de passeios às grutas. Muitos ainda mantêm a mesma rotina, com ligeiras alterações: “de madrugada lançávamos as artes; limpávamos o barco e vínhamos para a Praia da Dona Ana esperar que alguém quisesse ir às grutas, enquanto o sol estivesse alto. À noite ou na madrugada seguinte íamos recolher o pescado”, fala José Jorge; ao que Nuno Amantes acrescenta que “ainda esta manhã fui largar alguns alcatruzes para apanhar polvo”.

“O barco de madeira foi chão que já deu uva” menciona Isidro, mais conhecido por Cravinho: “fiz biscates com um barquinho de madeira do meu irmão, em 1976, na Praia da Dona Ana”. Os antigos barcos de madeira, baseados nas antigas caravelas dos descobrimentos, tiveram de ser gradualmente substituídos pelos tradicionais barcos de fibra: “fomos obrigados a deixá-los porque não tinham condições de encalhe, precisavam de muita manutenção e podiam romper se batessem numa pedra,” menciona Vítor Santos. Conta-se pelos dedos de uma mão os barcos de madeira que continuam no activo, como é o exemplo do Rio Alacem, com mais de 60 anos, que era uma “das enviadas de Alvor para carregar sardinha para as fábricas conserveiras”, assim como o que “carregava o andor da Nossa Sra. nas festas religiosas,” diz Isidro.

Os pequenos barcos tradicionais, agora em fibra, destinam-se apenas a fazer passeios marítimo-turísticos, com segurança e todos os elementos precisos para os manobrar: “com um barco largo as redes e depois pego no outro, que está limpinho, para os passeios.” Cravinho menciona que a “malta começou a juntar dinheiro [nos inícios dos anos 80], para comprar um barco de fibra” do qual não podem faltar as medidas de segurança e uma longa vara: “como trabalhamos na praia, onde o ponto de maré é muito baixo, temos de manobrar o barco entre a areia e as rochas, onde não nos é possível colocar a hélice do barco a trabalhar. Daí o uso deste pau para manobrar o barco para o sítio certo.”

Neste grupo de 40, Lucindo, de 86 anos, continua a mostrar e a ensinar os recantos da costa a quem queira inteirar-se da sua história! São perto de 50 anos de atividade nas grutas e mais de 70 como pescador. Este e os restantes elementos foram construindo as rotas pelo intrincado rendilhado de falésias, grutas esculpidas e pequenos areais, onde confessam que não foi por acaso a escolha dos nomes dos sítios que dão a conhecer: “Temos uma gruta que lhe chamamos a cozinha, porque quando vinham ventos fortes era o abrigo onde comíamos antes de nos fazermos à faina,” fala Vítor Santos.
Este complemento às pescas começou na Praia da Dona Ana, com os turistas do Hotel Golfinho, mas foi-se espalhando pela cidade em quatro pontos estratégicos: Avenida dos Descobrimentos, Cais da Solaria, Praia da Dona Ana e Ponta da Piedade: “em parceria com a Junta Autónoma dos Portos do Barlavento e o Capitão do Porto, por volta de 1986, foram organizados 4 postos de trabalho, pelo grupo dos 40, em modo rotativo”, fala Isidro.

A essência de Lagos foi e continua a ser criada por estes homens, pela sabedoria partilhada em cada passeio, mas não só! A sua condição humilde transmite o que há de mais autêntico, natural e genuíno, uma lição à imaginação de um tempo em que os pescadores por não saberem escrever contavam os passeios dando nós numa corda: “cada nó era uma viagem; dois nós seguidos representavam uma viagem com quatro pessoas,” refere José Jorge. São chefes de família que conseguiram, por este meio, proporcionar aos seus filhos um futuro melhor. São os mesmos que têm em si um enraizado sentimento de pertença e orgulho em fazer parte deste grupo e de ter feito vida em Lagos: “A cultura? Estamos a vivê-la todos os dias!”

Filipa Glória

Mar d’Estórias

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