Vende-se o futuro
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Vende-se o futuro

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Vende-se o futuro

Já reparou que estamos constantemente a comprar o futuro? E por comprar, entende-se não apenas o uso do dinheiro nas transações, mas a pura aceitação das ideias antes mesmo que elas aconteçam, assim, pagamos antecipadamente com a fé aquilo que talvez venha a se realizar oportunamente. Então somos movidos pela crença, ou se preferir, pelos sonhos? Ao que tudo indica, sim! Talvez o tempo todo, mesmo que sequer percebamos, nos atiramos ao futuro como se ele fosse algo concreto, praticamente certo. Do contrário, como seria o próximo instante?
É claro que agimos desta forma por força da experiência registrada no passado a nos dizer que grossa fatia das ações rotineiras do porvir decorrerá normalmente, mas veja que, ainda assim, são meramente tendências, e, nada, absolutamente nada pode garantir com total precisão a realização em si, afinal, a aleatoriedade pode levar a melhor e nos deixar mais próximos da intrometida incerteza, portanto, vivemos despercebidamente agarrados ao terço íntimo da fé ao louvar um provável futuro no altar das possibilidades. Quem diria?

Somos programados evolutivamente a contar com o futuro, e o vivemos mais intensamente do que imaginamos, e, se considerarmos as mínimas ações quotidianas, estamos verdadeiramente muito mais com os pés no daqui a pouco do que no aqui e agora, pois o presente, sob esta ótica, demonstra quase inexistir, por exemplo, se vamos tomar um copo de água, observe, desenhamos mentalmente os cenários: pegando o copo, abrindo a torneira do filtro ou a porta do frigorífico, trazendo-o até a boca, bebendo… (dá até para sentir a deliciosa sensação), mesmo sob o “domínio” ocasional dos comportamentos automáticos nos quais abrimos espaço a outros pensamentos simultaneamente, pois o cérebro se encarrega de fazê-lo através dos típicos comandos que vão do estímulo eletroquímico até as respostas das regiões corporais (músculos, ossos, etc) envolvidas em tal processo de forma muitíssimo rápida, mas desenhado inevitável e antecipadamente. Logo, incontáveis movimentos são marcados com imagens que tendem a ocorrer, impregnados da fé na sua concretização. Ainda, o que dizer dos interessantes bens a nos provocar com as mil promessas? Os lugares a serem visitados na compra do tão sonhado carro, a recente roupa, o uso do novo telemóvel…

Porquanto vivemos a comprar o futuro a vida inteira, e por uma razão aparentemente simples, ele está à venda o tempo todo. Mas, como em qualquer negócio, para que se alcance esta venda, requer-se tanto a vontade quanto o ato da compra, o que implica necessariamente na movimentação deste tipo de economia autorregulada, existente no instável e livre mercado da espécie humana. Pergunte-se: porventura não é possível até rejeitarmos a água, nas vezes que eventualmente possamos estar significativamente desanimados, impedindo a compra e a venda de tal futuro? Salvo nestes casos radicais a depender do tempo e dos seus efeitos, a roda dos sonhos gira continuamente porque é alimentada pela energia da fé dos seus fiéis consumidores.

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